A DIVERSIDADE É UMA BÊNÇÃO QUE VEM DO ESPÍRITO SANTO.

A experiência do Espírito Santo é a culminância da caminhada pascal. Chegamos à celebração de Pentecostes depois de um percurso de descobertas e encontros com o Senhor ressuscitado que durou sete semanas.  Como a comunidade reunida em Jerusalém, pedimos que o Espírito renove em nós os prodígios que realizou no início do cristianismo, esperando que este Sopro de Deus nos dê respiro e vida, nos ensine a testemunhar e anunciar o Reino de Deus na língua das diversas culturas, amadureça nosso apreço pela diversidade, desmanche os muros que nossos medos e prepotências ergueram, abra as portas das nossas igrejas e nos empurre para a missão. E que ele suscite e sustente o enamoramento em todos os casais e nos desperte para o encanto escondido em cada criatura.
“Há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo.”
O Espírito Santo é dom, presença e força vital de Deus nas suas criaturas e nos caminhos da história. Ele suscita e sustenta a comunhão entre o Pai e o Filho; possibilita e mantém a comunhão dos cristãos entre si, como membros de um único corpo, e com Cristo como sua cabeça; abre todas as criaturas para uma interdependência e colaboração essecial e vital. Mas cumpre esta obra maravilhosa criando e sustentando a riqueza da diversidade.
Acostumados a uma uniformidade que simplifica e favorece o domínio, temos dificuldades de reconhecer o valor da diversidade. A revelação nos ensina que a diversidade é querida e desejada por Deus. Será que alguém ousaria duvidar que, no interior da criação, a diversidade de elementos químicos, plantas, insetos, aves, répteis, animais, gêneros, dias, noites, estações, etc. seja uma bênção? Você pode imaginar um dia sem ocaso, um inverno sem fim, uma floresta só de eucaliptos, uma humanidade composta só de homens e de brancos?
A própria diversidade de línguas e culturas é uma bênção de Deus e uma forma de proteger a humanidade. Sendo uma e única, a humanidade vê, sente, pensa, age, trabalha, crê, celebra e se comunica mediante diferentes linguagens. A imposição de um único modo de pensar e de se comunicar é meio caminho para construir impérios que asseguram a dominação dos mais fortes e espertos sobre os mais fracos. Por isso, o próprio Deus dispersa os povos e arruína o projeto de uma cultura uniforme.
“Há diferentes atividades, mas é o mesmo Deus que realiza tudo em todos.”
Mas será que podemos afirmar algo semelhante em relação às religiões e Igrejas cristãs? Seria correto dizer que a diversidade de Igrejas e religiões é querida por Deus e uma bênção para a humanidade? E por quê não? Infelizmente, os mesmos grupos, movimentos e instituições que defendem a uniformidade cultural, o pensamento único, o imperialismo econômico e a supremacia da civilização ocidental suscitam e apóiam projetos religiosos excludentes e violentos.
Não este não é o caminho de Deus. Os evangelhos nos revelam que Jesus é muito aberto e tolerante em relação às diferenças religiosas: sendo um praticante do judaísmo, ele respeita o movimento samaritano e demonstra apreço pela postura religiosa de pessoas pagãs. Chega a dizer que o que importa não é a religião, mas a prática e a lealdade (cf. Jo 4,23). E as primeiras comunidades cristãs seguem o mesmo rumo, louvando a Deus pela experiência e pela vivência espiritual de gente de diferentes religiões.
Custou e está custando muito, mas o magistério da Igreja católica afirma hoje o valor positivo das diferentes religiões e Igrejas cristãs. Reconhece que, inseridas nas diversas culturas, as religiões procuram dar respostas válidas às questões fundamentais do ser humano, propondo caminhos de vida nas doutrinas, preceitos e ritos (cf. NA 2). E se reconhece unida às diversas Igrejas cristãs e seus fiéis mesmo quando não professam a integridade da fé ou não estão em comunhão com o Papa (cf. LG 15).
“Como é que nós os escutamos em nossa própria língua de orgem?”
Na evangelização e na pastoral, o dom e princípio da diversidade se expressa na inculturação. Não deixa de impressionar como o relato dos Atos dos Apóstolos insiste que cada um os diferentes grupos étnicos e culturais reunidos em Jerusalém na manhã do pentecostes escutam a pregação dos apóstolos na sua própria língua de origem (cf. At 2,6.8.11). É isso que causa espanto e admiração, além de uma certa confusão nas mentalidades muito arrumadinhas. O que impressiona é propriamente a diversidade!
Está claro que não se trata de um misterioso fenômeno psíquico, como esses que hoje são promovidos ao vivo em certas redes católicas de televisão. Por trás das palavras do relato está a afirmação do princípio da inculturação do Evangelho de Jesus Cristo. O Espírito Santo possibilita e exige que o anúncio e o testemunho de Jesus Cristo, assim como o diálogo e o serviço solidário que o acompanham, assumam a linguagem das diversas culturas e contextos.
Numa Igreja que se abre constantemente ao Espírito de Jesus Cristo não há lugar para ritos, práticas, linguagens, doutrinas, leis, estruturas e ministérios uniformes e fossilizadas. Mas como é difícil admitir, assimilar e, mais ainda, colocar isso em prática! Pior ainda quando, recorrendo maliciosamente ao respeito à diversidade, se procura impor um rito e uma língua que ninguém mais fala e que não consegue se livrar de uma história de imposição e intolerância.
A cada um é dada a manifestação do Espirito em vista do bem de todos.”
Uma expressão sifnificativa da presença ativa do Espírito Santo no mundo e nas pessoas são os vínculos de amor, amizade e solidariedade. Onde o Espírito é acolhido as pessoas isoladas se reúnem, os membros formam um corpo. É uma comunhão que ultrapassa os indivíduos e se estende às coletividades humanas, às organizações sociais e a todas as criaturas. O Espírito nos livra da desintegração, do amargo destino de ser um fragmento desarticulado, perdido no tempo e no estaço.
A força do Espírito está na raiz do dinamismo que une namorados, pessoas e gerações diferentes numa unidade familiar, étnica e nacional. Esta comunhão se amplia na comunidade eclesial, centrada na memória e na missão de Jesus de Nazaré. É uma comunhão que vai além das fronteiras de família, de etnia e de nação, um tecido costurado pela experiência de uma dignidade afirmada e de uma missão compartilhada. Aqui a diversidade dos membros não só é tolerada mas também promovida e celebrada.
É este dinamismo de comunhão suscitado pelo Espírito que aproxima e articula as diferentes comunidades cristãs e religiões. A diversidade de religiões e Igrejas cristãs não é apenas fruto dos limites e pecados da humanidade, mas também expressão plural do único Mistério de Deus que se autocomunica respeitando a diversidade cultural. Aqui também podemos dizer que cada religião e cada Igreja cristã recebeu o dom de manifestar o Espírito em vista do bem de todos.
“Como o Pai me enviou, também eu vos envio.”
Mas o Espírito Santo não se coaduna com o silêncio omisso, com o individualismo espiritual, com a submissão medrosa ou com a passividade irresponsável. O Espírito é a força de ação de Deus na história e a força da ação libertadora de Jesus Cristo. Ele nos é enviado como dinamismo missionário, como capacidade de gerar o homem novo e a nova sociedade: partilhar o pão, curar doenças, perdoar e acolher pecadores/as, anúnciar o Evangelho, denunciar as opressões, partir em missão.
Segundo João, os discípulos são enviados por Jesus Cristo com o “sopro” do Espírito para, como ele, “tirar o pecado do mundo”: superar e eliminar as práticas de dominação em si mesmos e nas instituições sociais, políticas e religiosas. E isso com sentido de urgência, sem preguiça, sem deixar nada para depois, pois o pecado que não erradicarem continuará produzindo seus frutos amargos. Nada de portas fechadas ou de braços cruzados! A afirmação da diversidade vai de mãos dadas com a missão!
“O que significa isso?”
Deus Pai justo e Mãe compassiva, fonte da abençoada diversidade, origem e meta da missão: como os nossos pais e mães, esperamos e suplicamos o precioso dom do teu Espírito. Que ele venha como vento que arrasta o pó acumulado nas velhas leis e estruturas, ritos e posturas. Que ele venha como vínculo de comunhão respeitosa e benfazeja de povos, culturas, religiões, Igrejas e movimentos. Que ele venha como um terremoto capaz de acordar e desestabilizar uma Igreja que dorme e se sente segura.  Que ele venha como gari que limpa o mundo da feiúra do pecado. Que ele venha com a suavidade da brisa que celebra a diversidade e revigora quem quase perdeu a esperança. Assim seja!
Pe. Itacir Brassiani msf

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